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segunda-feira, 26 de abril de 2010

Caim e Abel
 
Vou lhes contar uma história estranha. Aconteceu aqui perto de casa no tempo em que ainda era jovem. Moro aqui na vizinhança desde meus dez anos de idade. Sempre via muitas coisas acontecerem por entre os becos e as ruelas entre as laterais das casas.
Certa vez um jovem por quem eu muito tinha prestígio amanheceu morto e semi nu aqui no bequinho das laranjeiras. Estava com um corte de faca no pescoço e as mãos amarradas pela frente na altura da virilha, sentado com a cabeça baixa e sangrando. Disseram por aí que foi vingança por conta de estupro, mas eu não acreditei. Na vida a gente vê tanta coisa, não é mesmo? Na certa foi planejado para que tivessem essa interpretação.
Um dia marcante que me recordo bem foi a chegada de Dona Camila aqui na vizinhança. Viúva por causa da guerra trabalhava dobrado para dar uma boa educação para os três filhos: Davi, o mais velho, Dario, o do meio, e Darlene a caçula. O tal do Dario era meio peralta, o Davi já era um pouco mais sério e a Darlene uma princesinha. A pequena vivia enfeitada de cor-de-rosa encantando todo mundo na redondeza. Todo mundo conhecia a rosinha da Dona Camila.
Quando a mãe saia deixava Davi responsável pelos irmãos. Com todo esse poder conferido ao garoto dava bronca no irmão por ficar pulando no sofá e na irmã por ficar colocando a mão dentro da privada. Quando a mãe chegava encontrava a casa em ordem, porém, o filho mais velho estapiado ou esmurrado e Darlene defendo o irmão do meio. Davi de vez em quando trazia umas rosas bem vermelhinhas para mim. Apesar de ser informada depois por seu irmão que eram arrancadas do meu próprio jardim eu não ligava muito. Fazia até bem, assim eu ia reciclando as plantas do jardim com a ajuda do menino. Sempre gostei de cuidar das plantas. Eu só dava bronca no Dario por que ele arrancava sempre a mais vermelhinha para que o irmão não viesse a dá-la a mim. Tudo bem... São crianças...
Mas as crianças crescem e se tornam adultas. Não faz muito tempo, Davi comprou uma casa aqui na frente de casa. Casinha simples, mas ajeitadinha. Um dia desses me dei por conta olhando pela janela de que havia um jardim na frente de casa e que não era o meu. Pois é... O garoto fez questão de plantar as próprias rosas pra distribuir entre as senhoras da vizinhança. O Dario estava se esforçando muito na Universidade e trabalhando muito para começar a planejar o casamento com a namorada Bárbara. Já a Darlene estudava pra entrar na Universidade. Tempos difíceis...
Em um jantar de família Davi conheceu Bárbara e já em pouco tempo se tornaram amigos. Contavam tudo um para o outro. Dario não gostava muito disso. O Rapaz temia o tipo de assunto que podia ocorrer nessas conversas. Davi e Bárbara combinaram de sair para conversar. Chamaram Dario, mas ele estava muito atarefado com a monografia sobre a medicina na guerra. Davi deixou um bilhete na escrivaninha do irmão avisando que iria ao quiosque do centro da cidade com Bárbara. O irmão foi pedir o carro de Darlene emprestado já que não tinha um. Ela torceu o nariz e não liberou. No fim Bárbara evitando a chateação pegou o carro do namorado e foram.
Quando Dario chegou do trabalho não encontrou o carro estacionado na garagem e correu para dentro de casa a procura da namorada. Encontrou o bilhete do irmão avisando sobre o passeio noturno. Ao certo mil coisas devem ter passado pela cabeça do rapaz. Vi pela janela Dario desesperando implorando para a irmã que o emprestasse o carro. Mas como havia feito com Davi acabou fazendo ao irmão do meio. O rapaz então se sentou na calçada de casa e abaixou a cabeça. Parecia estar desesperado . Viu os vizinhos saírem das casas e formarem um alvoroço. Eu sai de casa também e vi Dario perguntar ao seu Noberto o que estava acontecendo. Chamei o rapaz e disse o que haviam me informado. Uma menina tinha sido seqüestrada e estuprada.
Entrei para casa e abri a janela dos fundos. De lá vi o carro de Dario chegando pela entrada traseira da garagem. Entrei para assistir TV já mais calma sabendo que nada tinha acontecido à pequena Bárbara. Em seguida ouvi gritos, e barulhos contínuos de lata e madeira e por ultimo um de carro apressado fazendo a curva da esquina. Assustada me recolhi no quarto e fui rezar.
No dia seguinte peguei o jornal e vi a reportagem de dois irmãos que acabaram discutindo e encaminhando a um homicídio. O repórter contava que as testemunhas disseram que o irmão do meio filho de uma viúva de um major do exército guardava inveja do irmão mais velho e por isso tinha o matado. Disseram as testemunhas que ouviram as seguintes frases. “Amarro-te as mãos para que não me tomes nada no inferno e corto-te a garganta para que nem na terra possa-o fazer”.
“A policia encontrou o rapaz morto sentado com a garganta em corte de faca e as mãos atadas na altura da virilha. O zipper da calça encontrava-se aberto e as mãos contendo substância que parecia ser urina. O acontecimento abalou a população da pacata vizinhança de João de Frêitas. Nunca mais se passará da mesma forma pelo beco das laranjeiras...”

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